[...]
Penetra surdamente no reino das
palavras
Lá estão os poemas que esperam
ser escritos.
Estão paralisados, mas não há
desespero,
há calma e frescura na superfície
intata.
Ei-los sós e mudos, em estado e
dicionário.
Convive com teus poemas, antes
de escrevê-los.
Tem paciência se obscuros. Calma,
se te provocam.
Espera que cada um se realize e
consume com seu poder e
palavras e seu poder de silêncio.
Não forces o poema a
desprender-se do limbo.
Não colhas no chão o poema
que se perdeu.
Não adules o poema. Aceita-o
como ele aceitará sua forma
definitiva e concentrada
no espaço.
Chega mais perto e contempla as
palavras.
Cada uma
tem mil faces secretas sob a face
neutra e te pergunta, sem interesse
pela resposta,
pobre ou terrível, que lhe deres:
Trouxeste a chave?
Repara:
ermas de melodia e conceito
elas se refugiaram na noite, as palavras.
Ainda úmidas e impregnadas de sono,
rolam num rio difícil e se transformam
em desprezo.
Autor: Carlos Drummond de
Andrade.
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